quinta-feira, abril 23, 2009

Dr. Govindappa Venkataswamy (“Dr.V.”)



"...os humanos foram postos na Terra não para ficarem ricos, mas para servir."
Dr. Govindappa Venkataswamy (1918-2006)


Escolhi o "Dr.V" como primeiro personagem da minha ORDEM DE MELQUISEDEQUE. "Dr.V" revolucionou o mundo Oftalmológico e contribuiu para que milhões de pessoas, em vários países do mundo, voltassem a enxergar.


"Ele ["Dr.V"] foi o mais próximo que eu cheguei de um santo de verdade".— Dr.Geoffrey Tabin, oftalmologista e editor do CATARACT & REFRACTIVE SURGERY TODAY


Nós até podemos entender que palavras como as acima possam ser ditas por pessoas religiosas. Mas, saber que essas palavras foram proferidas por um oftalmologista americano, e que o "santo" em questão era um oftalmologista Hindu e Indiano, deve despertar a nossa curiosidade, não acha?

Afinal, quem foi "Dr. V"?

Para responder essa pergunta, eu traduzo um tributo ao "Dr.V." escrito por outro Oftalmologista americano, Dr. Richard Litwin. Como seu mentor, "Dr. V", Dr. Litwin tem lutado discretamente para mudar o nosso mundo e a Assistência Oftalmológica na Ásia há mais de 30 anos.


SEPTEMBER 2006 I CATARACT & REFRACTIVE SURGERY TODAY


Dr. Govindappa Venkataswamy, fundador do Aravind Eye Hospital em Madurai, Sul da Índia, faleceu em 7 de julho de 2006, com 87 anos de idade. Suas contribuições para Oftalmologia tiveram um impacto sem precedentes em tratamentos oftalmológicos nos países em desenvolvimento. No ano passado, os médicos, em cinco hospitais que ele construiu com a ajuda de seus familiares e pessoas que o apoiavam em todo o mundo, realizaram 200.000 grandes cirurgias oculares e trataram 2 milhões de pessoas. A maior parte destes tratamentos foi disponibilizado a custo reduzido ou sem custo para o paciente e foi financiado por modestas taxas pagas por aqueles que podiam. "Dr. V" foi um cirurgião lakh, significando que ele próprio realizou mais de 100.000 cirurgias.


INÍCIO HUMILDE


Dr Dr. V nasceu numa aldeia familiar no estado de Tamil Nadu, no Sul da Índia. Durante uma estada no Corpo Médico do Exército Indiano, ele desenvolveu um olho afiado para a logística que serviu-lhe bem mais tarde, quando ele supervisionou a expansão do Aravind Eye Hospital. Quando estava na escola médica, Dr. V foi internado por um ano, porque ele sofria de artrite psoriásica grave, que deixou as mãos dele acentuadamente deformadas (Figura 1). Após abandonar o objetivo de se tornar um obstetra, ele começou Oftalmologia porque sentiu que essa especialidade seria menos exigente fisicamente.



Foto 1. Dr.V era capaz de fazer cirurgia de
cataratas apesar de suas mãos deformadas.


Vários interesses na juventude moldaram a carreira de Dr. V. Além de participar do movimente pela Independência da Índia (quando jovem, ele se encontrou com Mahatma Gandhi), ele se tornou devoto de Sri Aurobindo, um mestre religioso Indiano, que deu nome ao Hospital Aravind. O grupo Aurobindo tem uma tranqüila Ashram na ex-cidade Francesa-Indiana de Pondicherry, onde o Dr. V passou muito tempo em meditação. Até sua aposentadoria em 1976, com 58 anos de idade, ele era um professor de oftalmologia no Madurai Medical College.


"Dele [de Sri Aurobindo] aprendi que o ser humano é um instrumento nas mãos de Deus, que todos nós, através da profissão, podemos servir a humanidade e a Deus. É um erro pensar que a menos que você seja um mártir não possas chegar a ser uma pessoa espiritual. Todos os dias, quando me aproximo do "quarto de meditação", no hospital, peço a Deus que faça de mim um bom instrumento, um recipiente para receber e transmitir a sua força divina. Não é necessário ser uma pessoa "religiosa", para servir a Deus. Nós podemos servir a Deus prestando um serviço à humanidade".
"Dr.V"

Logo após sua aposentadoria, a família unida, bem instruída e dinâmica, do Dr. V o ajudou a criar um hospital gratuito com 11 leitos em uma casa privada em Madurai. Logo depois, o falecido Dr. Charles L. Schepens lançou a Pedra Fundamental do novo Hospital Aravind. Em 1984, que tinha sido expandido para um hospital de 200 leitos. O edifício original foi transformado em uma pousada – que muitos voluntários iniciais lembram de maneira nostálgica. No entanto, os esforços do Dr. V no Aravind Hospital foram apenas o catalisador de uma reação em cadeia que mudou a Oftalmologia na Ásia.


CONHECENDO DR. V


Conheci o Dr. V, em 1982, quando minha esposa Judith e eu chegamos ao seu acampamento Ofalmológico em Pondicherry (Figura 2). Eu assisti (e suava no calor da Índia), enquanto cirurgiões trabalhavam no palco de um gigantesco teatro. Cada uma das oito mesas era resfriada apenas por um ventilador (Figura 3). No decurso de poucos dias, o chão do teatro se encheu com pacientes operados. Os cirurgiões trabalhavam sem palavras e os pacientes cooperavam em silêncio. Depois que os procedimentos terminavam, mulheres com bonitos saris floridos deitavam em simples tapetes de palhas que seriam suas camas por uma semana (Foto 4). Voluntários de comunidades locais de serviços alimentavam e cuidavam dos pacientes. Minha esposa e eu fomos atraídos pelo drama e, sobretudo, pela dedicação da equipe.











Foto 2. Dr. Litwin olha enquanto Dr.V
examina um paciente com cataratas.












Foto 3. Cirurgiões operam cataratas em uma Sala de Operações improvisada em Pondicherry, India, em 1982.
















Foto 4. Pacientes descansam no chão do teatro após serem operados de catarata.


No principal Hospital Aravind em Madurai, encontrei a irmã mais nova do Dr. V, Dra. G. Natchiar, também uma excelente cirurgiã oftálmica. Eu havia trazido um suprimento de LIOs* doadas ao hospital. (Nota do tradutor: LIO parece ser uma espécie de Lente Intraocular que é implantada dentro do olho durante a operação de Catarata). Elas eram uma tecnologia nova no Hospital Aravind. Dra. Natchiar e eu implantamos várias dessas lentes. Na manhã seguinte, Dr. V chamou um repórter do jornal Daily Hindu para escrever sobre os resultados.

O nosso primeiro paciente a receber um implante de LIO foi um carpinteiro idoso que me assustou, tentando beijar meus pés, quando tirei o seu curativo. Dr. V explicou que o homem estava encantado, não só porque ele podia ver, mas porque ele podia trabalhar – um resultado muito diferente do que se ele tivesse sofrido extração intracapsular de catarata com lentes +10.00D. O paciente poderia novamente sustentar uma família ou mesmo reembolsar o custo de sua operação.

Com a bênção do Dr. V e lotes de LIOs oriundas dos E.U.A. os cirurgiões em Aravind logo se tornaram especialistas em extração intracapsular de catarata e inserção de PCIOLs. O procedimento se tornou tão popular que era impossível atender as demandas dos pacientes pelas "Maravilhas no olho". A solução revolucionária do Hospital Aravind, com a ajuda de fundações em todo o mundo, foi construir Aurolab, uma fábrica dedicada à produção local de LIOs de baixo custo.

Em 1982, uma LIO feita nos EUA custava US $ 500. Poucos anos mais tarde, Aurolab fabricava um produto com a última tecnologia por menos de US $ 3. Hoje, a fábrica produz mais de 1 milhão de LIOs a cada ano. Elas são vendidas para países em desenvolvimento ao redor do mundo e torna o tratamento moderno possível para muitos dos pobres do mundo. Aurolab agora fabrica suturas, viscoelástico, e muitos medicamentos também.


INFLUÊNCIA DURADOURA DO "DR. V"


"Nosso esforço é para fazer Aravind um instrumento da Vontade Divina. Nós nos esforçamos para esquecer as nossas limitações e trabalhar com a direção da Vontade Divina. Não de uma maneira vã e superficial, mas com um profundo compromisso e com fé que a orientação vem de um nível maior de consciência. Assim, alguém é capaz de trabalhar com a grande confiança que vem apenas com a fé de que somos todos parte de uma capacidade espiritual ou poder espiritual. É então que toda a natureza trabalha com você. Você não sente que você é um ser superior, mas que você é um instrumento nas mãos de uma força maior e é nesse espírito que nós encaramos os lutas e os êxitos do nosso dia-a-dia".
"Dr.V"


Enquanto eu estava visitando Aravind em 1982, dei uma palestra sobre implante de LIOs. Na audiência estava um jovem oftalmologista Nepalês, Dr. Sanduk Ruit, e sua futura esposa, uma enfermeira linda chamada Nanda. Cinco anos mais tarde, eu e ele iniciamos uma série de experimentos em Kathmandu para determinar se podíamos implantar LIOs, com segurança, em pacientes cegos por catarata, que viviam nas montanhas remotas do Nepal. Eu trouxe os suprimentos e o Dr. Ruit desenvolveu as técnicas. Os pacientes ficaram encantados e as técnicas se tornaram padrão no Nepal. Logo, assistido por um conselho de jovens empresários Nepaleses e a Fundação Fred Hollows da Austrália, Dr. Ruit construiu o Centro de Olhos Tilganga – que é agora o mais movimentado hospital de olhos em Katmandu e fornece assistência ao longo dos Himalaias.

Em 1991, o alpinista / oftalmologista Dr. Geoffrey Tabin, se juntou a mim e ao Dr. Ruit em um dos nossos acampamentos. Dr. Tabin se tornou apaixonadamente envolvido pelo nosso trabalho. Ele seguiu em frente e formou o Himalayan Cataract Project, uma organização que tem sido instrumental na expansão das atividades do Tilganga em Sikkim, Butão, Paquistão, Tibete, China, e tão longe como a Coréia do Norte.


UMA PESSOA EXTRAORDINÁRIA


A grande força do Dr. V foi a sua capacidade de persuadir centenas de pessoas de diferentes estilos de vida a adotar e trabalhar em direção à realização de suas metas, geralmente de pouca ou nenhuma remuneração. Embora Aravind tenha centenas de empregados, maioria deles trabalha com salários reduzidos apenas para que possam ser parte do sonho do Dr. V. Ele tinha uma visão clara do que era preciso fazer para eliminar a cegueira, que incluiu não só o tratamento, mas também a pesquisa científica sobre a maneira de trazer as pessoas para oftalmologia e vice-versa. Seus métodos eram sempre atuais e, mais recentemente, incluía a telemedicina.

Mais do que qualquer cirurgião que eu conheço, Dr. V parecia não ter ego. Uma vez, ele me disse que ele começava cada dia imaginando uma criança cega. Ele nunca discutia. Ele dava a sua opinião e então seguia em frente. Ele estava focado em acabar com a cegueira.

Dr. V também assumia uma abordagem espiritual no trabalho com os seus colegas e funcionários. Em vez de destituir um gerente por baixa performance Dr. V chamava o homem para o seu gabinete e abria um livro de Sri Aurobindo. Então, ele e o gerente liam em voz alta sobre as possibilidades do desenvolvimento de uma mente mais elevada pela humanidade. Melhorias se seguiam com certeza.

Às vezes, o Dr. V interrompia conversas sobre questões mundanas para discutir seus últimos pensamentos sobre eliminar a cegueira. Ele era extremamente simples na sua vida, suas vestimentas, e sua comida. Quando ele não estava discutindo sobre a cegueira, ele estava interessado na vida de seus colegas e seus filhos. Muitos são os amigos que confiaram um filho ou filha ao Dr. V, assim eles poderiam experimentar a vida na pousada e absorver o espírito altruísta do Aravind. Às vezes, essa experiência vinha em um momento delicado na vida da criança. Todos regressavam enriquecidos. Dr. V conhecia o sofrimento através da sua própria batalha de toda a vida com a artrite psoriática. Ele conhecia sobre as mais elevadas possibilidades do espírito humano através de Sri Aurobindo, e sobre a perseverança para atingir os objetivos através de Gandhi.

Meu amigo, professor, e inspiração se foi. Estou triste porque eu não mais verei o seu sorriso ou ouvirei o seu riso. No entanto, eu estou consolado por saber que a obra de sua vida está nas melhores mãos, as de seus familiares e amigos que compartilham suas percepções e atitudes. Aravind vive e cresce através deles. Que continue assim.

Richard L. Litwin, MD, clinica no Berkeley Ofthalmology Medical Group em Berkeley, Califórnia, e faz parte do conselho de administração da Himalayan Cataract Project.
Dr. Litwin pode ser encontrado em (510) 548-6330; rlitwin@mac.com.

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Espero que a história de vida do Dr. V haja inspirado e desafiado você. Saber que foi aos 58 anos de idade que ele construiu o primeiro Hospital Aravind nos mostra que sempre é tempo de começar a servir aos outros. Ele realizou tudo isso sem dinheiro do Governo ou de ONGs, mas apenas com o dinheiro da aposentadoria e uma vontade imensa de fazer com que cegos pudessem ver novamente.


Abaixo, uma revista brinca exibindo a manchete que chama "Dr. V" de "Dr.Visionário".
















Dr. Visionário
"Se Coca-Cola pode vender bilhões de refrigerantes e
McDonalds pode vender bilhões de sanduíches,
Por que Aravind não pode vender milhões de operações
restauradoras da visão e, eventualmente, a crença na
perfeição humana?"



Muito mais eu teria a dizer, no entanto, finalizo dizendo que, para mim, Dr. V é um "sacerdote do Altíssimo" e pertence a ORDEM DE MELQUISEDEQUE.

Para saber mais, acesse http://www.aravind.org/


Bento Souto
23 de abril de 2009.
bentosouto@caiofabio.com

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