A palavra “tradição” aparece onze vezes no Novo Testamento (João Ferreira de Almeida, Edição Revista e Corrigida). Das onze ocorrências, em apenas uma somos incentivados a “guardar a tradição” (2 Ts 3:6). Nas outras dez vezes a “tradição” havia se transformado em Tradicionalismo, e se encontrava em oposição aos desígnios de Deus.
Existe uma tradição que não podemos abrir mão, a saber, a tradição dos apóstolos. O próprio apóstolo Paulo nos declara isso no contexto da Segunda Epístola aos Tessalonicenses. E o que vem a ser isso? Talvez o “Credo dos Apóstolos” seja um sumário das grandes doutrinas cristãs. Nele, as principais doutrinas da Fé Cristã são apresentadas. Apesar desse exemplo de Tradição que deve ser preservada, tenho a impressão que há muita Tradição, em nossos dias, que acabou sendo transformada em Tradicionalismo. Qual a diferença entre Tradicionalismo e Tradição?
Tradicionalismo é “apego às tradições ou usos tradicionais; conservadorismo”. Tradição é “tudo o que se pratica por hábito ou costume adquirido”, e ainda “herança cultural, legado de crenças, técnicas etc. de uma geração para outra” (Dicionário Houaiss - 2001).
Sei de igrejas batistas que vem enfrentando críticas ferozes porque seus membros resolveram começar a cantar louvores a Deus em ritmos atuais ou regionais. Muitos dizem que essa igreja está se tornando “mundana” ao trocar os “hinos santos” pela música do mundo. O que esses críticos não sabem é que as mesmas críticas, que eles fazem em relação a ritmos atuais ou regionais, no passado, foram feitas aos hinos.
Vejamos um pouco da história dessa controvérsia.
Em 1 de Março de 1691, em sessão administrativa, a maioria dos membros da Igreja Batista em Horsleydown, Londres, seguindo a orientação do Pr. Benjamin Keach, aprovou a proposta de cantar um hino, todos os domingos, após o sermão.
O grupo de insatisfeitos com aquela inovação, liderados pelo irmão Isaac Marlow, promoveu uma grande resistência. Não só dividiram a igreja em Horsleydown, mas também publicaram livros e panfletos criticando a “nova moda”.
A discussão foi levada à Convenção das Igrejas Batista de Londres em Junho de 1692. O motivo de tanta discussão era porque o grupo de Marlow só aceitava que Salmos (pois os mesmos eram inspirados por Deus) fossem cantados na igreja. Diziam eles que cantar “hinos” era “imitar o mundo”.
Inúmeros livros e panfletos foram escritos a favor e contra os hinos. O debate escrito só acabou em 1698.
Entretanto, muitos historiadores afirmam que essa discussão só terminou mesmo em 1736. Naquele ano, a igreja Batista de Maze Pond, que havia sido estabelecida pelos contrários ao cântico de “hinos” de Horsleydown, convidou Abraham West para ser seu pastor. O pastor West condicionou sua ida à Maze Pond ao cântico de hinos pela congregação. A igreja aceitou. (J.Barry Vaughn - Baptist Theologians - B&H, págs.53-55)
Esse exemplo mostra como uma inovação, que sofreu tantas resistências em seu começo, se tornou “tradicional” em nosso meio.
Devemos lembrar que o Cantor Cristão não existia antes do Pr. Benjamin Keach. Ele também foi fruto de uma inovação.
Atualmente, muitos não conseguem ver que a forma tradicional de fazer as coisas foi uma inovação que alguém fez. Com o tempo, muitos imitaram aquela inovação e ela se tornou Tradição.
Ou seja, o Cantor Cristão (ou até o HCC) não foi criado por Deus, mas foi uma inovação “para o louvor de Deus”.
Não é obrigatório que essa inovação (que se tornou tradição) seja usada para sempre.
Não tentemos satanizar as inovações dos outros.
Quem sabe se elas não se transformarão em uma nova Tradição?
Portanto, cuidemos para que nossas “Tradições” não se tornem “Tradicionalismo”.
Abcs Bento Souto
2 comentários:
Bento!! Belissimo !!!Gostei muito do seu texto.
abraços
Parabéns, Bento, por mais essa reflexão. Estou aguardando um artigo seu sobre os "ungidos do Senhor", assim bem explicado e esclarecedor como você faz.
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